segunda-feira, 30 de julho de 2007

Pobreza de idoso explodiria sem Previdência

ANTÔNIO GOIS
Comparado com 5 países latino-americanos, modelo brasileiro é o que tem maior impacto na renda, diz estudo do Ipea
Mas pesquisadoras vêem necessidade de mudança porque sistema atual não poderá se sustentar no longo prazo
Comparado com Argentina, México, Peru, Costa Rica e Bolívia, o Brasil é o país com maior cobertura previdenciária na população com mais de 65 anos de idade e onde os benefícios são mais representativos na renda total dos idosos.
Sem esses ganhos, a taxa de pobreza urbana nessa faixa etária saltaria dos atuais 3,7% -o menor percentual entre os comparados- para 47,2%, o que a colocaria como a pior. Isso teria impactos também na taxa de pobreza (com base na linha de US$ 2 diários) de toda a população urbana, que passaria de 14,8% para 24,9%.
Essas são conclusões do mais recente estudo das pesquisadoras Ana Amélia Camarano e Maria Tereza Pasinato, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). O trabalho indica que mudanças bruscas na Previdência podem aumentar significativamente a taxa de pobreza entre os idosos.
Ajustes
Isso não significa, na opinião das duas pesquisadoras, que o sistema não necessite de ajustes. Pelo contrário. Elas afirmam no trabalho que "não se pode ignorar que a demanda por benefícios da seguridade social tende a crescer no médio prazo e, na ausência de mudanças, a acentuar o desequilíbrio financeiro da Previdência Social, o que inviabilizará o seu atendimento".
Para elas, o desafio é equilibrar as contas para garantir uma proteção social adequada, em vez de atacar essa proteção em nome do equilíbrio fiscal. "Os fins não podem ser trocados pelos meios, e a grande conquista que é o envelhecimento populacional não deve trazer embutida a sua falência."
Ao comparar diferentes países da América Latina -escolhidos por representarem sociedades com estágios diferenciados de envelhecimento-, as pesquisadoras mostraram que em nenhuma das nações analisadas a dependência dos recursos da seguridade social é tão alta quanto no Brasil.
No México, por exemplo, 64,3% da renda dos idosos na área urbana são provenientes do trabalho e apenas 27,1% da Previdência. No Brasil, essas proporções são, respectivamente, de 29,7% e 64,0%. A mesma situação se repete -e a dependência é ainda mais acentuada no caso brasileiro- quando se compara apenas as idosas ou a população rural.
De um lado, isso mostra a importância do sistema para a sobrevivência de milhões de idosos no Brasil. Mas, na opinião de Pasinato, leva também a uma discussão a respeito do sentido de um sistema de previdência público.
"A aposentadoria não deve ser encarada como um prêmio, um espécie de bônus que representará um acréscimo de salário no final do mês enquanto a pessoa continua trabalhando. Ela foi criada para manter o nível de renda de quem perdeu a capacidade de trabalho, seja por idade ou por invalidez", afirma a pesquisadora do Ipea, órgão ligado ao Ministério do Planejamento.
Mais contribuição
Para Camarano, um ponto essencial no debate a respeito da viabilidade do sistema brasileiro é como aumentar a proporção da população economicamente ativa que contribui para o sistema, que hoje é de menos da metade (47,4%).
A pesquisadora sugere também maior flexibilização nas regras de aposentadoria. Uma das opções é permitir que o trabalhador receba uma aposentadoria parcial e continue trabalhando, mas com uma carga horária menor, o que, em sua opinião, serviria também como um período de adaptação até a aposentadoria total.
"O sistema deve incentivar que o trabalhador continue na ativa o maior número de anos possíveis, mas, para isso, não basta apenas alterar a legislação, aumentando a idade mínima para a aposentadoria", afirma Camarano.
Na sua avaliação, a aposentadoria compulsória é também uma expressão de preconceito. "Aos 70 anos, muita gente ainda tem bastante capacidade produtiva. Com o avanço da tecnologia, se exige cada vez menos força física. A questão é que teremos uma sociedade cada vez mais envelhecida e precisaremos de força de trabalho. No Japão, eles compensam isso importando imigrantes. No Brasil, vamos importar quem?", questiona.
No trabalho, as pesquisadoras apontam também que o crescimento econômico é um componente importante da solução do problema da Previdência, mas não suficiente. Citam os exemplos da Argentina e do Peru, que têm observado taxas elevadas de crescimento, mas continuam com problemas sérios no sistema.
As pesquisadoras ressaltam que é preciso rediscutir as regras de aposentadorias de mulheres, para que o sistema leve em consideração que elas continuam gastando mais horas do que os homens nos afazeres domésticos, mas também que estão cada vez mais assumindo o papel de chefes de família.

Fonte: Folha de São Paulo

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