segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Falta-nos pessoal técnico

Marcelo Pimentel
O governo anunciou um programa de melhoria no sistema de bolsas de estudos, mestrado, etc., cujos estipêndios atuais são ridículos, principalmente naquilo que se refere à vida dos beneficiários no exterior. O sistema de Casas do Brasil, nas poucas capitais européias em que se instalou, nunca teve capacidade para atender a todos os interessados, muitos dos quais são tão sacrificados e pouco aproveitam dos estudos, obrigados a viver, não raro, em dificuldades.
O Brasil é um país que carece de planificação objetiva para formação de pessoal técnico. É um país pretensamente de doutores porque toda família almeja que seus rebentos metam um anel no dedão, se bem que ele seja mero sinal de exibicionismo. Toda exteriorização objetiva obscurecer a realidade, geralmente modesta.
Entretanto, os vícios de formação são notórios. Precisamos efetivamente de técnicos, essencialmente técnicos de nível médio com formação atualizada nos vários ramos do progresso e que possam agilizar a máquina industrial. Um operário que não se atualiza perde status de um ano para outro neste mundo tecnologicamente dinâmico. Não temos escolas de formação técnica suficientes e, em regra, no Brasil os operários são preparados nas próprias empresas empregadoras, dentro de suas limitações tanto orçamentárias quanto técnicas.
O sistema S, que, realmente, iniciou a formação básica do operariado nacional e ainda o faz efetivamente, não tem capacidade para atender a toda a demanda e seus ensinamentos não estão amplamente investidos do tecnicismo que o progresso atual exige. Geralmente os profissionais são preparados para simples ingresso no mercado de trabalho. Não possuem os equipamentos atualizados dentro da modernidade, que alcança níveis altíssimos e custos elevados. Basta ver a maquinaria de que dispõe a indústria automobilística, tudo altamente informatizado, para verificar-se que só o poder público, teoricamente, teria capacidade de sustentar a especialização de pessoal em bases amplas e complexas.
O Brasil tem que correr atrás do tempo perdido porque, se crescermos na base de 5% ao ano, fatalmente não teremos mão-de-obra habilitada para ocupar os postos que se criarem. Nem sequer com a demanda em níveis relativamente baixos conseguem-se candidatos capazes para prover as ofertas modestas que surgem.
A juventude brasileira que busca o mercado de trabalho, anualmente, é superior a milhão e meio e tenta obter emprego sem o mínimo preparo, quer técnico, quer intelectual. Entra-se, então, em um círculo vicioso, isto é, não pode melhorar ou iniciar sua formação técnica porque não possui conhecimento mínimo, eis que a escola pública é péssima, o ensino catastrófico e a falta de assistência social faz com que muitos jovens já estejam então correndo atrás de biscates para ajudar a sustentar a família.
A política bolsista anunciada está certa, mas não se pode esquecer da necessidade de providenciar a formação técnica da mão-de-obra que está buscando o mercado no primeiro nível e da formação média especializada. O Brasil não é só Sul e Sudeste. As demais regiões têm que ter assistência suficiente para tornar-se socialmente responsáveis, permitindo que suas populações integrem o boom econômico que vive o país.
Chegamos a ponto crítico. Não podemos crescer eficientemente porque não temos mão-de-obra suficiente, capaz de sustentar o crescimento, ainda mais quando se contam por milhões os patrícios que estão fora aproveitando-se de oportunidades que por lá surgem, ocupando empregos geralmente subalternos.
Na realidade, embora estejamos carentes de pessoal técnico bem educado, a escola pública é um fracasso retumbante apesar dos gastos expressivos que a ela se dedicam. Até em nível universitário existem dificuldades grandes porque os orçamentos das universidades não suportam mais os custos, fazendo que a preparação até nesse nível seja insuficiente, formando pessoal carente de melhor capacitação, inclusive porque o conhecimento no ingresso é nivelado por baixo, salvo exceções que confirmam a regra.

Marcelo Pimentel é Advogado, foi ministro do Trabalho e ministro presidente do TST

Correio Braziliense

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