terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Os medievais presídios do País

Pelo que se observa em todo o País, o sistema penitenciário brasileiro, com seu obsoletismo e deficiências gritantes, demonstra que ainda é remanescente do período medieval. Não dispõe de estrutura física adequada, brutaliza-se pela superlotação e coloca na mesma cela o recluso de maior e menor periculosidade. A reeducação é precaríssima e pouco profissionaliza, não havendo também presídios suficientes para mulheres. Não raro, os delitos e a violência partem do interior deles, conforme ocorre na maioria dos Estados. Recentemente veio à tona o tratamento degradante de que foi vítima uma menor na delegacia de Abaetetuba (PA), chegando a ser violentada por vários detentos, já que algumas autoridades locais, sobretudo o delegado e uma juíza, não tiveram a necessária precaução de mantê-la separada da cela dos detidos, pois a Carta Magna e o Código Penal asseguram o respeito à integridade física e moral dos presos, ainda mais em se tratando de uma jovem indefesa. Ficou comprovada a negligência de uma juíza e de um delegado de polícia sobre o caso. O Senado solicitou do Ministério Público do Pará minuciosas e amplas investigações relacionadas aos delituosos acontecimentos.
Além desse fato estarrecedor de Abaetetuba, que teve grande repercussão nacional, a imprensa já levantou outros episódios de mulheres que engravidaram nos presídios, tais a promiscuidade, o descaso e os descaminhos que predominam no antiquado modelo penitenciário brasileiro. Não bastasse esse intolerável estado de coisas, há também clamorosas falhas na pedagogia da reeducação e profissionalização dos reclusos e detentos. Os critérios dos regimes fechados, semi-aberto, progressão da pena, indultos, bom comportamento e demais benefícios admissíveis pela legislação penal merecem profundas reflexões pelos estudiosos da ciência penal, penitenciaristas, Ph.Ds do tema, sociólogos e outros versados na matéria. A vigilância também é fator relevante, pois não se pode conceber que reclusos direcionem qualquer forma de delito, a começar pelo crime organizado, do interior dos presídios para fora deles, a exemplo do que acontece em diversos Estados, inclusive no Rio, São Paulo e em Goiás.
Se os governos da União minimizam os investimentos na segurança pública, a situação é mais grave ainda quanto às reduzidas dotações de recursos financeiros destinados ao nosso retrógrado modelo prisional, o que constitui injustificável menosprezo para com esses setores da pública administração. A verdade é que se os governos federais não dão a devida importância à segurança pública e à complexa questão penitenciária, é porque esses setores não rendem votos, sobretudo o último, pois os presos, nos termos da lei, não têm direito ao voto. Daí porque os sucessivos governos não investem o suficiente na construção de presídios que sejam dotados de todas as condições indispensáveis à reeducação dos apenados: acomodações decentes para homens e mulheres, separação entre reclusos e detentos de maior e menor periculosidade, aprendizagens profissionais para seu retorno social, vigilância intensiva, assistência às famílias desamparadas, estímulo ao bom comportamento para otimizar a auto-estima, aprimoração dos métodos de recuperação, promoção do ensino religioso, proibição de quaisquer tipos de armas e drogas ilícitas no meio deles, edificação de reformatórios para menores com desvios de conduta.
Além de outras iniciativas pró-reintegração, cumpre implementar as visitas periódicas de assistentes sociais, psicólogos e a imprescindível agilização judiciária. Esta através das Varas de Execuções Penais e dos Conselhos Penitenciários. Pela estatística do magistrado Wilson da Silva Dias, da Vara de Execuções Penais de Goiânia, mais de 30% da população carcerária incorreu em delitos hediondos, o que é realmente alarmante. Afinal de contas, seja em Goiás ou nos demais Estados, impõe-se a modernização dos presídios no País (tidos como verdadeiras jaulas) para melhor readaptação, evitando que eles se tornem “fábricas de feras”.
Quanto à reintegração social dos reclusos, ou seja, dos que já aprenderam um ofício e estão aptos ao trabalho em múltiplos setores da sociedade, é imperioso que os governos e o Congresso Nacional encontrem soluções realistas para reconduzi-los ao trabalho sem o estigma de ter passado por uma reclusão. Em recente artigo neste jornal, o deputado federal Sandro Mabel disse que já apresentou projeto, acolhido na Comissão de Trabalho, criando o Programa Nacional de Incentivo ao Emprego de Egressos do Sistema Penitenciário, visando à qualificação deles(as). É que muitos, voltando à convivência social, são recebidos com preconceitos, não encontram emprego e terminam na reincidência da criminalidade. Trata-se de discriminação inaceitável, conforme preceitos da Constituição de 1988 e da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Cabe, pois, ao deputado goiano agilizar medidas para que seu projeto se transforme em realidade.
Retomando a situação medieval dos presídios brasileiros, o governo da União, em ação conjunta com os governos estaduais, está no dever de disponibilizar recursos necessários à construção de novas penitenciárias dentro de um padrão de estrutura física moderna, de qualidade técnico- científica, com ampla assistência jurídica e diversificados cursos de profissionalização. No caso goiano, o governador Alcides Rodrigues labora em equívoco quando, com o fim de cortar gastos, cogita de extinguir a Secretaria de Justiça e incorporá-la à Secretaria de Segurança Pública, a qual já enfrenta sérios problemas em sua área. O titular da SJ, Edemundo Dias de Oliveira Filho, é Ph.D. em ciência penitenciária, podendo a situação prisional se agravar com a extinção da Secretaria de Justiça.
Precisamos, enfim, de um modelo que seja dotado de todos os pré-requisitos para aperfeiçoar, tornar mais eficaz e humanizar os presídios do País, objetivando basicamente o pleno direito à reinserção social.
O Popular

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