segunda-feira, 14 de abril de 2008

O custo do entra-e-sai no mercado de trabalho

São R$25 bi gastos por ano no país com demissões e seguro-desemprego

A alta rotatividade no mercado de trabalho - processo de demissão e contratação em curto espaço de tempo - custa para o país pelo menos R$25 bilhões ao ano. O valor equivale a cerca de 7% da folha de pagamento brasileira ou a 1% do Produto Interno Bruto (PIB, soma dos bens e serviços produzidos no país). Somente em 2006, segundo levantamento do presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Márcio Pochmann, 7,7 milhões de brasileiros foram admitidos e dispensados em menos de 12 meses, acarretando um gasto de R$12,7 bilhões pelas empresas para cobrir custos de demissão. Isso sem contar o desembolso de R$12,3 bilhões do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) com seguro-desemprego.

Os recursos são derramados, porém, sem que o cenário mude: apenas 20% dos oito milhões de desempregados têm qualificação. E isso ocorre mesmo com agentes de treinamento, como escolas técnicas e o Sistema S, dispondo de um caixa de R$10 bilhões.

- O problema não é a falta de recursos, que chegam quase à arrecadação da CPMF. Toda essa dinheirama precisa ter um uso mais eficiente - diz Pochmann.

Considerando a verba de treinamento, o país gasta R$35 bilhões sem conseguir fazer com que as empresas contratem de forma mais eficiente e sem inserir o desempregado mais rapidamente no mercado de trabalho. A alta rotatividade, segundo o economista, é um fenômeno brasileiro, com efeitos perversos para a economia e para o trabalhador, que deixa de contribuir por um ano para a Previdência Social.

Trabalhando na construção civil há mais de dez anos, José Oliveira dos Santos está mais uma vez dando entrada no seguro-desemprego. Ele disse que já perdeu as contas das empresas por que passou. Aprendeu o ofício sozinho, sem nunca ter passado por curso de qualificação.

- Na construção, é assim: quando termina a obra, eles mandam a gente embora.

Mas o problema não se restringe à construção civil. A auxiliar de escritório Luziane Vasconcelos, de 21 anos, está de novo à procura de emprego. Ela conta que, nos últimos cinco anos, trabalhou em sete empresas diferentes. Na última, ficou menos de quatro meses.

- Trabalhei em restaurante, fui vendedora, promotora de vendas e caixa - lista Luziane, que agora aposta no curso de administração para conseguir mais estabilidade.

Curso na empresa em vez do Sistema S

Um dos efeitos da rotatividade, segundo Pochmann, é a perda de produtividade. Os trabalhadores passam por várias atividades nos diversos setores da economia, em pouco tempo. O presidente do Ipea afirma que falta um sistema público de emprego, capaz de integrar o pagamento do seguro-desemprego, a capacitação do trabalhador e o seu encaminhamento às empresas.

A rede do Sine, ligado ao Ministério do Trabalho, disse, funciona apenas como intermediador de mão-de-obra, além de ser um dos locais onde o desempregado faz a inscrição para receber o seguro-desemprego. Além disso, boa parte das vagas não passa pelo sistema.

Também não há planejamento que permita às escolas profissionalizantes e do Sistema S ofertar cursos mais adequados à demanda. Há unidades atuando nas mesmas áreas e, muitas vezes, concorrendo entre si.

- A falta de conhecimento é o principal problema - reforçou Marcio Pauline, dono de duas empresas de Informática em Brasília e Goiânia e que costuma substituir, pelo menos, quatro funcionários todo ano. Com isso, tem que pagar multa de 40% sobre o FGTS, aviso prévio, décimo terceiro e férias proporcionais.

Pochmann disse, ainda, que é preciso romper com a cultura da formação fora da empresa. Ele sugere que em vez dos empregadores recolherem os recursos ao Sistema S (2,5% da folha), dêem cursos aos seus funcionários no local de trabalho:

- A formação hoje é meramente técnica, abstrata. Precisamos avançar na formação na empresa.

Essa seria uma maneira de racionalizar os recursos, diante das demandas das empresas por profissionais qualificados. O argumento ganha força, sobretudo, num momento em que os investimentos sobem acima da produção há 41 meses, o que implica novas máquinas e formas de produção. E neste caso, não basta exigir apenas escolaridade.

Para o economista, o país está diante de um bom problema e não pode perder a oportunidade de criar uma política nacional pública de emprego. Embora o mercado formal tenha registrado resultados recordes, afirmou, é preciso não esquecer que existem oito milhões de desempregados e mais 2,3 milhões de trabalhadores que ingressam no mercado todo ano. Se o Brasil crescer 5%, pode gerar 2,5 milhões de postos neste ano.

O chefe do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV), Marcelo Neri, destacou que a rotatividade é ainda maior no setor informal. Ele disse que as chances de um trabalhador com carteira deixar o emprego é de 10% (um a cada 10); no caso dos informais, o percentual sobe para 40%.

O Globo

Nenhum comentário: