terça-feira, 15 de abril de 2008

OPINIÃO - Trabalho: Brasil e Reino Unido

José Pastore*

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) mantém programas de intercâmbio em suas congêneres em todos os continentes. O objetivo é a troca de informações e a criação de ambientes favoráveis para investimentos industriais.

Realiza-se hoje em Brasília um encontro entre os representantes da CNI e os da Confederation of British Industry (CBI, na sigla em inglês), do Reino Unido. O evento visa a esclarecer os participantes sobre as facilidades existentes e os problemas a vencer para chegar a um bom clima de negócios no Brasil.

Esse encontro foi precedido de visitas prévias nas quais se procurou examinar dois assuntos: o sistema de relações de trabalho e o sistema tributário. Os dois temas serão tratados hoje.

Tive a honra de ser convidado pela CNI para fazer com os ingleses um exercício de comparação entre as instituições do trabalho nos dois países. Aos britânicos, procurarei explicar o sistema brasileiro. Neste artigo, faço um resumo do sistema inglês. Sugiro aos meus leitores que leiam sentados para não se assustarem com as colossais diferenças.

Jornada de trabalho - a lei britânica estabelece um limite de 48 horas por semana. Mas, em caso de necessidade, como, por exemplo, para enfrentar uma despesa inesperada ou concretizar um plano de vida, os empregados podem trabalhar mais do que isso, a seu critério, sem nenhuma negociação. O valor das horas extras é negociado. Mas a jornada efetivamente trabalhada pelo pessoal de tempo integral é de 40,7 horas por semana, como fruto de acordo direto entre empregados e empregadores.

A propósito, as negociações coletivas no Reino Unido são raríssimas. Apenas alguns setores negociam coletivamente. Predominam os contratos individuais, nos quais os direitos dos empregados são assegurados pela lei e pelos regulamentos das empresas.

Os sindicatos não podem acionar as empresas. Toda ação deve partir do empregado. Se não for solucionada, a reclamação é comunicada simultaneamente ao Serviço de Conciliação e ao Tribunal do Emprego. Não existe a figura do “class action” e tampouco a da “substituição processual”.

Em 2007, houve apenas 115 mil reclamações. Cerca de 100 mil foram acertadas por conciliação em poucas semanas. No Tribunal de Emprego demoram alguns meses. Os acordos não têm força de lei, mas são rigorosamente obedecidos por questão de honra, como (orgulhosamente) dizem os ingleses. As principais reclamações são sobre demissões consideradas injustas.

Além de acertar as pendências, o Serviço de Conciliação difunde boas práticas trabalhistas, realiza treinamentos e presta consultorias às empresas e aos empregados em busca de um bom clima de trabalho.

Durante o primeiro ano de trabalho na empresa, os empregados podem ser dispensados livremente e mediante pagamento das verbas rescisórias. Depois de um ano, eles têm de ser notificados e, se não concordarem com o motivo alegado pela empresa, o caso é decidido por conciliação ou por julgamento - ambos expeditos.

A regulação do trabalho é promovida, em grande parte, pelo Ministério dos Negócios (Department of Business, Enterprise and Regulatory Reform) e a fiscalização é realizada, predominantemente, pelo Ministério do Trabalho. O primeiro estimula a geração de emprego e o segundo garante as proteções, punindo quando a pedagogia fracassa.

O trabalho temporário pode ser contratado livremente em qualquer atividade. Os trabalhadores temporários desfrutam de menos direitos quando comparados aos empregados fixos. Mas não ficam sem trabalho. Essa é uma importante janela de oportunidade para o trabalho dos jovens.

A força de trabalho tem um alto nível de preparação: 17,5% têm curso fundamental; 47,4% têm nível médio completo; 26,8% têm nível superior; 8,3% têm outros níveis. Cerca de 60% dos jovens estão na universidade.

O desemprego é de 5%, a informalidade é de 2%, a renda per capita é de US$ 40 mil, a taxa de inflação foi 2,1% e o crescimento chegou a 3,1% em 2007. Em matéria de competitividade, o Reino Unido é o 9º colocado entre mais de cem países analisados pelo World Economic Forum.

Como se vê, os contrastes são grandes. É claro que os países têm raízes diferentes. Não há por que copiar práticas trabalhistas. Tampouco se justifica ignorá-las numa economia globalizada. Vou ao evento com a esperança de uma boa troca de experiências. Depois eu conto.

*José Pastore é professor da FEA-USP. E-mail: jpjp@uninet.com.br. Site: www.josepastore.com.br

O Estado de S. Paulo

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