segunda-feira, 25 de agosto de 2008

A formalização do micronegócio

Com a justificativa de reduzir a mão-de-obra informal no País e provocar uma "pequena revolução" nos micronegócios, a Câmara dos Deputados aprovou na semana passada projeto de lei complementar (PLP 2/07) que permite aos trabalhadores por conta própria - como decoradores, paisagistas, representantes comerciais, jornalistas, assessores de imprensa, fisioterapeutas, tradutores e corretores de seguro - converterem-se em "microempreendedores individuais".

O projeto, de autoria do deputado Mendes Thame (PSDB-SP), agora será submetido à apreciação do Senado. Ele dá tratamento tributário preferencial aos trabalhadores informais com receita bruta de até R$ 36 mil ao ano. Esses trabalhadores poderão aderir ao Simples Nacional (Supersimples), ficando com isso dispensados de contribuições e impostos mais pesados, como Imposto de Renda, IPI, PIS, Cofins e CSLL. O projeto é apoiado por entidades empresarias, que estão se mobilizando politicamente para que o texto não sofra alterações no Senado. A idéia é votá-lo entre setembro e outubro, para que possa ser sancionado até dezembro pelo presidente da República.

Pelos cálculos da Confederação Nacional das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Comicro), existem na economia informal cerca de 8 milhões de microempresas que dão trabalho a uma só pessoa e 1,2 milhão de microempresas onde trabalham o patrão e um empregado. Entidades como o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e a Confederação Nacional do Comércio estimam que, transformado em lei o projeto, num primeiro momento, 30% desse pessoal aderirá ao Supersimples. Os mais otimistas acreditam que, num segundo momento, camelôs, vendedores ambulantes, pedreiros, feirantes, mecânicos, manicures, costureiras e artesãos também escolherão esse tratamento tributário diferenciado, ingressando dessa maneira na economia formal.

O projeto autoriza os microempreendedores individuais a ter um único empregado que receba salário mínimo. Ele também simplifica os procedimentos burocráticos, dispensando os microempreendedores de abrir firma, manter contabilidade e emitir nota fiscal. Para os vendedores, por exemplo, basta guardar as notas fiscais de aquisição dos produtos. Além disso, os microempreendedores poderão se aposentar pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e receber benefícios previdenciários, como pensão, salário-maternidade, auxílio-acidente e outros afastamentos remunerados. Para que tenham esses direitos, eles terão de recolher, mensalmente, apenas R$ 1,00 por mês a título de ICMS; R$ 5,00, a título de ISS; e R$ 45,65, de contribuição para a Previdência. Para estimular a formalização e facilitar o recolhimento, este poderá ser feito na conta de energia.

O projeto ainda permite que os microemprendedores individuais formem "Sociedades de Propósito Específico", que nada mais são do que uma espécie de "consórcio societário" especialmente constituído para permitir a aquisição conjunta de insumos e matérias-primas. O objetivo dessa medida é dar maior poder de barganha aos microempreendedores. "Eles precisavam de amparo legal", diz o presidente da Confederação Nacional das Microempresas, José Tarcísio da Silva.

O projeto, contudo, peca num ponto. Se os trabalhadores que hoje se encontram na informalidade aderirem maciçamente a esse sistema, pagando apenas R$ 45,65 por mês para a Previdência, a médio prazo, quando começarem a receber benefícios, haverá uma considerável pressão sobre as contas do INSS, hoje deficitárias em cerca de R$ 40 bilhões. Os defensores do projeto afirmam que haverá um significativo aumento da receita previdenciária no curto prazo e que os microempreendedores, uma vez formalizados, terão acesso a crédito diferenciado e ampliarão seus negócios, o que beneficiaria toda a economia.
A formalização da mão-de-obra que hoje trabalha na economia subterrânea é um objetivo social e econômico que deve ser perseguido para assegurar o desenvolvimento do País. Esse é o maior mérito do projeto. Mas não se pode negar que, a médio prazo, ele abre caminho para novas pressões sobre o INSS. É sobre isso que o Senado deve refletir.

Folha de S.Paulo

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