terça-feira, 7 de agosto de 2007

A pedagogia da multa na greve

José Pastore
Na paralisação do metrô da semana passada, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo puniu o Sindicato dos Metroviários com uma multa de R$ 200 mil por violação da Lei de Greve e outra de R$ 1,7 milhão por descumprir compromisso firmado perante a Justiça do Trabalho e o Ministério Público (o que caracteriza litigância de má-fé).
Isso é pouco ou muito para uma greve que tumultuou a cidade, impôs sofrimento a milhões de usuários e enormes perdas à economia?
Em 2005, o Sindicato dos Despachantes de São Paulo foi condenado e está pagando uma multa de R$ 300 mil por ter realizado uma passeata ilegal na capital que afetou apenas mil pessoas. À luz desse caso, as multas do TRT foram irrisórias.
O próprio Sindicato dos Metroviários já levou sustos maiores. Em 2006, por ter deflagrado uma greve fora da lei, o Ministério Público condenou-o a pagar uma indenização de R$ 70 milhões, o que torna as multas do TRT apenas simbólicas.
O Brasil ainda não possui uma lei que discipline as paralisações nos serviços públicos, mas tem um diploma legal que estabelece regras claras para o exercício da greve no transporte coletivo, que é considerada uma atividade essencial.
Trata-se da Lei 7.783/89 que, dentre outras coisas, exige que o sindicato dos trabalhadores, esgotada a fase da negociação, informe as autoridades e os usuários com 72 horas de antecedência e mantenha equipes para garantir um mínimo de serviços para evitar um colapso, sendo o sindicato responsável por seus atos perante as leis trabalhista, civil e penal.
Mas os metroviários de São Paulo gostam de desafiar a lei e a Justiça. Em menos de um ano fizeram quatro greves, sem pré-aviso e sem manter os serviços mínimos. Duas foram greves políticas - uma contra a utilização das Parcerias Público-Privadas (PPPs) na construção da Linha 4 e a outra contra a chamada Emenda 3, assuntos que nem admitem negociação, pois nada têm que ver com as condições de trabalho ou com a Companhia do Metropolitano de São Paulo.
Para agir como fazem, os grevistas sempre invocam o seu “sagrado direito de greve”. Ao que me consta, nenhum direito é sagrado. Direito é o que está escrito na Constituição e nas leis, e vai acompanhado de deveres que os metroviários não respeitam. Eles pensam estar acima do bem e do mal a ponto de poder ferir a população como fizeram na semana passada.
É verdade que no caso das greves dos servidores públicos há um vácuo legislativo que está à espera de uma iniciativa séria do presidente Lula que, sem se dar conta, passou da posição de líder de grandes greves para a de maior empregador do País e guardião da ordem pública.
Felizmente, esse vácuo não é total a ponto de justificar selvagerias. O Supremo Tribunal Federal deixou claro que, enquanto não se aprovar a lei complementar prevista no artigo 37 da Constituição Federal, os funcionários que trabalham nas atividades essenciais têm de obedecer à Lei 7.783/89. Nada justifica a paralisação intempestiva dos metroviários, assim como as dos médicos dos prontos-socorros e postos de saúde, dos funcionários da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, dos fiscais agropecuários e dos policiais militares e federais que já duram meses. A negação dos seus serviços afeta a sobrevivência, a saúde e a segurança da população e está enquadrada no artigo 11 da referida lei.
Portanto, não é necessário fazer mais leis para disciplinar esses casos. Basta aplicar as que existem, como fez o TRT. O direito de greve tem de ser exercido dentro de seus limites e jamais passar por cima dos direitos da população.
As multas aplicadas visam a levar os dirigentes sindicais a pensarem duas vezes antes de agir. Infelizmente, a punição dos R$ 70 milhões não foi levada avante, razão pela qual os líderes dos metroviários continuam achando que podem violar a lei eternamente.
Esperemos que as novas multas sejam para valer. Dessa forma elas exercerão o seu importante papel pedagógico. Sim, porque para pagar os quase R$ 2 milhões é bem provável que o sindicato tenha de ratear essa importância entre os metroviários. Como o órgão mais sensível do corpo humano é o bolso, garanto que na próxima vez eles comparecerão em massa à assembléia da entidade e demandarão dos dirigentes um pouco mais de juízo antes de jogar a categoria numa aventura como essa.
*José Pastore, é professor da FEA-USP. E-mail: jpjp@uninet.com.br. Site:
Fonte: O Estado de S. Paulo

Nenhum comentário: